Um projeto de lei aprovado em primeira votação na Câmara Municipal de Vitória da Conquista reacendeu o debate sobre o papel da religião na educação pública. A proposta, de autoria do vereador Edivaldo Ferreira Júnior (PSDB), autoriza o uso da Bíblia como material complementar nas escolas municipais. A matéria foi discutida durante a sessão ordinária desta sexta-feira (23) e gerou forte repercussão entre os parlamentares.
“A Bíblia não é apenas um livro espiritual. É o livro mais vendido do mundo, com mais de 5 bilhões de cópias traduzidas para mais de 3 mil idiomas. Qual o problema de ela ser utilizada como apoio didático? Estamos criando cidadãos, crianças com base em princípios”, argumentou o vereador.
O parlamentar também afirmou que o projeto não obriga escolas a adotarem o livro, apenas autoriza seu uso como recurso complementar. Edivaldo criticou colegas que, segundo ele, fazem “discurso para redes sociais sem ler a proposta”, e afirmou representar a maioria cristã da cidade.
“Projeto fere a laicidade e impõe visão religiosa”
A proposta foi duramente criticada pelo vereador Alexandre Xandó (PT), que entende que a medida afronta o princípio da laicidade do Estado brasileiro. Segundo Xandó, o texto foi elaborado sem diálogo com professores, sindicatos ou o Conselho Municipal de Educação.
“Disfarçado de proposta pedagógica, o texto privilegia, mais uma vez, uma religião específica em um espaço que deve ser inclusivo, científico e plural. Não é papel do Legislativo municipal definir quais livros entram em sala de aula, muito menos impor, uma visão de mundo religiosa em um ambiente que deve respeitar todas as crenças”, disse o vereador em sua rede social.
Xandó ressaltou ainda que não há ensino inclusivo onde há imposição religiosa, e destacou o risco de exclusão e discriminação de alunos que não compartilham da fé cristã.
“A escola é para todas as crenças — inclusive para quem não tem nenhuma. É um espaço de liberdade e respeito, e não pode ser transformado em extensão de púlpito religioso”, disse.
O que diz a Constituição?
O Brasil é um Estado laico, como estabelece o artigo 19 da Constituição Federal, o que significa que o poder público não pode promover ou favorecer nenhuma religião. Embora o ensino religioso seja permitido, ele deve ser não confessional, ou seja, sem vínculo com doutrinas específicas.
Especialistas em direito constitucional alertam que o uso da Bíblia como material didático — ainda que de forma complementar — pode ser interpretado como quebra da neutralidade do Estado e gerar judicializações.
Lei que permite uso da Bíblia em escolas de BH entra em vigor
Apesar disso, projetos como esse tem se espalhado nos Estados Unidos e no Brasil. Nesta quinta-feira, entrou em vigor em BH, a lei sancionada pelo presidente da Câmara Municipal, Juliano Lopes (Podemos) que autoriza a utilização de histórias bíblicas como “apoio pedagógico” em disciplinas como História, Literatura e Filosofia, com participação facultativa dos alunos.
O texto foi sancionado pelo presidente da Câmara Municipal de Belo Horizonte (CMBH), vereador Juliano Lopes (Podemos), já que o prefeito Álvaro Damião (União Brasil) não se manifestou dentro do prazo previsto. Com isso, há a prerrogativa de sanção automática pelo presidente do Legislativo.
Em Vitória da Conquista o projeto precisa passar por outra votação para depois ser encaminhado à prefeita Sheila Lemos, que poderá sancionar, vetar ou até mesmo não se manifestar.
Com informações do G1