incêndio do Atacadão: Catadores(as) coletam mais de mil toneladas de materiais recicláveis
O trabalho de triagem realizado pelos catadores(as) em Vitória da Conquista garantiu que mais de mil toneladas de materiais provenientes do incêndio ocorrido em abril no Atacadão fosse inserida no ciclo da reciclagem. Ao todo, os profissionais coletaram 1.036.540 kg ou 1.036,54 toneladas de recicláveis em um mês de trabalho. A triagem dos resíduos sólidos foi possibilitada pelo termo de compromisso firmado pela Defensoria Pública da Bahia-DPE/BA para que o supermercado fizesse a doação dos resíduos às organizações de catadores(as) locais.
O documento foi assinado no último dia 04 de maio e, desde então, os(as) catadores(as) realizam a triagem e beneficiamento de materiais na Usina de Reciclagem da Comlurb, empresa de coleta que havia sido contratada para transportar os materiais descartados. A Associação de Coletores de Materiais Recicláveis de Vitória da Conquista-ACRES e a Cooperativa de Catadores Recicla Conquista são as organizações responsáveis pela realização do trabalho.
“O material coletado ajudou muitas famílias. Tem gente que trabalha o mês inteiro e não consegue fazer nem R$ 300. Nesse período trabalhando no Atacadão, teve gente que conseguiu fazer mais de um salário mínimo”, conta o presidente da ACRES, Wallace Souza Costa. Ele estima que, somente a associação que ele representa conseguiu gerar R$ 10 mil com o material coletado, mas a contabilização da coleta ainda está em andamento.
Wallace explica ainda que o fato da triagem ter sido realizada em um espaço específico também contribuiu para a lucratividade. “Geralmente, a gente não tem lugar específico para coletar materiais recicláveis, vamos de porta em porta. Isso dificulta muito o nosso trabalho”, assinala. Entre os materiais encontrados pelos(as) catadores(as) estavam polietileno de alta densidade, alumínio fino, alumínio grosso, plástico cristal e PET, cujos custos de venda variam de R$0,80 a R$8,00 por quilo.
A defensora pública e coordenadora do Núcleo de Gestão Ambiental (Nugam), Kaliany Gonzaga, ressalta que além da geração de renda para os(as) catadores(as), o termo de compromisso firmado pela DPE/BA garantiu outros benefícios, como o desvio do material do aterro municipal, redução de custos para o Atacadão, benefícios ao meio ambiental e benefícios econômicos para o poder público municipal e setor empresarial.
“Os(as) catadores(as) são prestadores de serviço público e agente ambiental de limpeza urbana, seja pela quantidade de material desviado dos locais de disposição final e aumento da vida útil de aterros sanitários. Além disso, a força de trabalho dos catadores é apropriada pela indústria da reciclagem diante da porcentagem de material reincorporado por eles ao ciclo de vida do produto e pela redução dos custos provenientes da logística reversa”, explica a defensora pública.
Ao todo 62 pessoas atuam na triagem do material doado pelo supermercado. Elas foram indicadas pelo serviço de assistência social da Defensoria, levando em conta critérios como o grau de vulnerabilidade, a participação equitativa de integrantes das duas organizações, o volume de resíduos sólidos descartados para beneficiamento e a participação em treinamento destinado ao adequado e seguro manejo dos resíduos sólidos.
Termo de compromisso
O termo de compromisso firmado pela Defensoria para garantir a doação dos resíduos do incêndio do Atacadão também envolveu a Prefeitura Municipal e, a fim de evitar ocorrência de crime ambiental, o delegado de polícia Marcus Vinicius Morais. A atuação da Defensoria visa a adequação da gestão de resíduos sólidos à Política Nacional de Resíduos Sólidos (PNRS) e à lei de gestão de resíduos implantada em Vitória da Conquista com participação da DPE/BA durante o processo de tramitação da lei.
Segundo a defensora pública Kaliany Gonzaga, o apoio da DPE/BA para elaboração do termo de compromisso com o Atacadão foi solicitado pela Secretaria de Serviços Públicos devido à atuação na assistência jurídica aos(às) catadores(as) prestados pela instituição no município de Vitória da Conquista desde 2016.
“A Política Nacional de Resíduos Sólidos prevê uma Política de Proteção das Catadoras e Catadores, devido a um compromisso histórico, político e social com esses profissionais responsáveis há décadas pela coleta seletiva municipal, quando ainda não havia nenhuma legislação que disciplinasse a gestão de resíduos sólidos”, destaca a defensora pública Kaliany Gonzaga.
Perfil dos catadores
De acordo com os dados de uma pesquisa realizada pelo Nugam, em Vitória da Conquista, 83,5% das pessoas que atuam na catação de materiais recicláveis são negras e a maioria têm renda mensal familiar de no máximo R$ 500 reais (57%). Em Salvador, o percentual de pessoas negras chega a 97,1% e 75% dos profissionais não arrecadavam mais que R$ 100 por mês com a recilagem.
Em Conquista, o levantamento foi realizado com informações sobre 347 catadores cadastrados na Associação Coletores de Resíduos Sólidos Recicláveis de Vitória da Conquista – o cadastro é feito pelo Programa Mãos que Reciclam. Já em Salvador, a pesquisa foi feita em parceria com o Fórum de Catadoras e Catadores de Rua e em Situação de Rua do Estado, e a amostra foi de 174 catadores.
A pesquisa divulgada em 2021 apresenta ainda dados sobre a incidência de problemas de saúde ou deficiência entre os profissionais – 40% em Conquista e 29,3% em Salvador – e indicadores de escolaridade: em ambos os municípios, cerca de 40% dos profissionais não concluíram o ensino fundamental. O percentual de analfabetos é de 29,4% em Conquista e 25,3% em Salvador.