Prefeitura encerra apoio à Casa do Estudante Quilombola e vereadores protestam

Na sessão desta quarta-feira (10), vereadores de diferentes partidos criticaram a decisão da Prefeitura de Vitória da Conquista fechar a Casa do Estudante Quilombola Dandara dos Palmares e pediram que o Executivo apresente uma solução imediata para garantir moradia aos estudantes em situação de vulnerabilidade.

O vereador Subtenente Muniz disse confiar em solução do Executivo e destacou a importância da Casa do Estudante Quilombola afirmando  que acompanha de perto a situação. Segundo Muniz, o município não pode permitir que jovens quilombolas e de baixa renda fiquem sem abrigo: “Nós não podemos deixar os nossos estudantes, que têm dificuldade em se manter na cidade, sem um local para ficar. A sensibilidade do secretário Michel e do coordenador Ricardo Alves vai falar mais alto, e a Prefeitura vai encontrar uma forma de manter a Casa dos Estudantes Quilombolas”, declarou.

O vereador Alexandre Xandó (PT) fez duras críticas ao fechamento da casa, criada em 2008 e considerada por ele a primeira Casa do Estudante Quilombola do país. Para Xandó, a atitude do governo municipal é “um absurdo” e uma “afronta à memória de Elizabeth Lopes (Beta)”, fundadora do projeto, falecida recentemente.

Ele rebateu todas as justificativas apresentadas pelo Executivo — problemas estruturais, irregularidades contratuais e presença de estudantes de outros municípios. Segundo Xandó, a casa só está deteriorada porque o município deixou de investir em reformas ao longo dos anos, e os danos já causaram perdas de objetos em dias de chuva.

O vereador também argumentou que questões contratuais poderiam ser resolvidas com vontade política e lembrou que a presença de estudantes de vários municípios sempre fez parte do propósito do projeto educacional.

Segundo Xandó. atualmente, 13 estudantes vivem na casa — vindos de Vitória da Conquista, Livramento, Rio de Contas e Barra da Estiva — e cursam Enfermagem, Psicologia, Pedagogia, Jornalismo, Cinema, Biotecnologia, Agronomia e cursos profissionalizantes.

“Não estamos falando de centenas de pessoas. A vida desses jovens está em risco. Eles estão no final do semestre sem saber onde vão morar. Isso é inadmissível”, disse. Xandó anunciou ainda que irá destinar uma emenda impositiva para garantir o custeio da Casa: “Quero ver se agora a Prefeitura vai dizer que não tem recurso. Estou fazendo a minha parte. O Município vai cumprir?”

Ele informou também que organizará uma vigília no local, ao lado dos estudantes, para evitar o despejo.

Márcia Viviane: “Fechar a casa é ignorar a história e o impacto social do projeto”

A vereadora Márcia Viviane reforçou a crítica ao fechamento e destacou que o projeto já formou profissionais de diversas áreas, incluindo médicos e advogados, muitos deles oriundos de quilombos da região.

Para ela, o Município optou pelo “caminho mais fácil”: encerrar a iniciativa em vez de buscar alternativas.
“Toda a documentação está em dia, e até agora a Prefeitura não apresentou solução. Optou por encerrar um projeto social idealizado por Beta, que não está mais aqui para testemunhar essa tristeza”, afirmou.

Denúncia pública cobra transparência e acusa Prefeitura de omissão

Além das falas da Câmara, uma denúncia pública divulgada por representantes da Casa do Estudante Quilombola acusa a Prefeitura de descontinuidade injustificada de um projeto histórico e essencial.

O documento ressalta que toda a documentação da Associação está regularizada e afirma que o Município divulgou informações graves sem comprovação técnica ou direito de resposta.

Segundo a denúncia, em reunião realizada em 2 de abril, a própria Prefeitura reconheceu que o imóvel se tornou inviável após chuvas intensas no fim de 2024 — mas afirmou estar “de mãos atadas” e não ofereceu alternativa emergencial.

O texto acusa omissão institucional e alerta para violação de direitos humanos, educacionais e sociais: “Fechar portas históricas de acesso à educação é aprofundar desigualdades.”

Casa Dandara dos Palmares

Fundada em 2008 por Elizabeth “Beta” Lopes, a Casa do Estudante Quilombola foi a primeira do tipo no Brasil e sempre teve a missão de combater o racismo estrutural, ampliar o acesso à universidade e garantir permanência estudantil para jovens de quilombos e periferias.

O fechamento, sem plano de realocação, deixou os estudantes em situação de incerteza enquanto finalizam o semestre letivo.

O QUE DIZ A PREFEITURA

A Prefeirtura alega  irregularidades encontradas no contrato que havia entre o Município e a instituição Dandara dos Palmares, responsável por gerir o equipamento, problemas estruturais no imóvel, e diz que a maioria das vagas na casa está ocupada por estudantes de outros municípios.

Ainda de acordo com a Prefeitura, a questão mais grave é a ausência da documentação necessária para o funcionamento do espaço, o que tornaria a continuidade da parceria com o Governo Municipal inviável, uma vez que para ser mantida, a Casa do Estudante precisaria estar de acordo com a Lei nº 13.019/2014, que institui normas para as parcerias entre a administração pública e organizações da sociedade civil, em regime de mútua cooperação.

Ricardo Alves

Segundo o coordenador municipal de Igualdade Racial, Ricardo Alves, os responsáveis pela casa não apresentaram o estatuto social do equipamento, atas de eleição e posse dos gestores, além do plano de trabalho, documentos exigidos pelo Marco Regulatório das Organizações da Sociedade Civil (MROSC).

“Descobrimos uma série de irregularidades que impossibilitam, de imediato, qualquer forma de novo contrato”, informa Ricardo, acrescentando que havia uma fragilidade jurídica muito grande na documentação da Casa do Estudante Quilombola, a ponto de o Governo Municipal não dispor de informações oficiais seguras sobre o funcionamento do local. “Há uma desconexão muito grande dos dados”, explica.

Além dos problemas burocráticos, o coordenador relatou a situação da estrutura do imóvel, que sofreu danos devido a uma chuva ocorrida em novembro de 2024. Em visita ao local, a Defesa Civil identificou problemas estruturais graves, como rachaduras e infiltrações. O proprietário solicitou ao Município, a devolução do imóvel.

Outra questão também apontada pela Coordenação de Igualdade Racial é o fato de que somente uma parte muito pequena dos estudantes atendidos no local é de Vitória da Conquista. Ricardo informa que o Município não possui competência para estabelecer políticas regionais – o que caberia ao Governo Estadual. “Não temos como atender estudantes de outros municípios”, argumenta Ricardo Alves.

Ainda segundo Ricardo, “não há como manter o contrato da forma como está. Mas o Município tem interesse, sim, em manter esse tipo de equipamento. Vamos estudar possibilidades em longo prazo, em curto prazo não temos o que fazer”.

O contrato se encerrou em 30 de junho, mas a Prefeitura já havia informado aos gestores sobre o fechamento há quase oito meses. “Eles estão cientes da desocupação desde dezembro do ano passado”, diz.

Agora, a Coordenação de Igualdade Racial analisa outras formas de manter o auxílio aos estudantes quilombolas do município, porém esclarece que, nesse momento, o serviço será descontinuado. “Pretendemos regularizar a política de habilitação e moradia no município, devidamente regularizada e com responsabilidades e competências. E para estudantes de Vitória da Conquista”, destaca o coordenador.

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