
Jaqueline Ferreira, mãe da criança, diz que problema ocorre constantemente. Foto: Caique Santos
O impedimento de uma criança autista de desembarcar pela porta dianteira de um ônibus em Vitória da Conquista gerou polêmica e levantou questionamentos sobre o cumprimento das leis de acessibilidade no transporte coletivo municipal.
O caso ocorreu com a pequena Cecílya, de 9 anos, diagnosticada com Transtorno Opositivo-Desafiador (TOD), Autismo e depressão. Segundo sua mãe, Jaqueline, a criança estava em crise e tem fobia de passar pela catraca, mas mesmo assim a cobradora impediu sua saída pela porta dianteira e tratou a família, segundo ela, de forma ríspida. Jaqueline, denunciou o caso ao Ministério Público, Polícia Civil e Conselho Tutelar.
A menina foi impedida de desembarcar pela porta dianteira, sob a alegação da cobradora de que era obrigada a cumprir ordens da empresa, por conta de uma portaria municipal que exige que todos os passageiros passem pela catraca, sem exceção.
DESCUMPRIMENTO DE LEI FEDERAL, DIZ ADVOGADO DA FAMÍLIA
De acordo com o advogado Lucas da Cunha Carvalho, que defende a família, essa exigência não pode se sobrepor às leis federais que garantem acessibilidade, respeito e tratamento adequado a Pessoa com deficiência, violando diretamente a lei 13.146/2015, Estatuto da Pessoa com Deficiência, bem como o Estatuto da Criança e do Adolescente e por fim ao Código de defesa do consumidor, que assegura o direito à prestação adequada de serviços públicos essenciais.
Ainda segundo o advogado, a cobradora teria insultado a mãe da criança e, ao perceber que Cecílya já estava fora do coletivo, sugerido que o motorista fechasse a porta e levasse Jaqueline à delegacia.
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Dr. Lucas da Cunha Carvalho: “Atlântico deve ser responsabilizada”
Dr. Lucas, que também é advogado a APAE e tem uma filha neurotípica, afirmou à nossa reportagem que a empresa Atlântico deve se responsabilizar pelo ocorrido. “Já tomamos todas as medidas legais cabíveis e aguardamos um posicionamento oficial da empresa, bem como a adoção de providências para evitar que situações como essa se repitam. O respeito à dignidade da pessoa humana e o direito à acessibilidade são garantias fundamentais que não podem ser ignoradas”, disse Dr. Lucas Carvalho.
O QUE DIZ A PREFEITURA
Diante da repercussão do caso, a Prefeitura de Vitória da Conquista afirmou que está apurando os fatos e esclareceu que nenhuma portaria municipal pode se sobrepor a uma lei federal. Como medida corretiva, a Secretaria Municipal de Mobilidade Urbana (Semob) informou que irá regulamentar pontualmente essa questão, através de uma ‘minuta’, para permitir o desembarque de autistas também pela porta da frente.
A gestão municipal também informou que está preparando uma cartilha de orientação para cobradores e motoristas, além de solicitar cursos de capacitação sobre relações humanas para evitar novos casos como este. Veja no final da matéria a íntegra da nota da Semob
O QUE DIZ OS RODOVIÁRIOS
O Sindicato dos Rodoviários (SINTRAVC), representante legal dos cobradores e motoristas, manifestou apoio às investigações e revelou também ter recebido denúncias de que motoristas e cobradores são penalizados financeiramente caso descumpram as orientações da empresa. De acordo com os rodoviários, a multa imposta pela empresa pode chegar a R$ 150 por ocorrência, o que coloca os profissionais em um impasse e desorientação.
O QUE DIZ A ATLÂNTICO
Procurada pelo Blog do Caique Santos, representantes da Atlântico em Salvador, em vez de nos encaminhar à assessoria de imprensa, nos passou o contato do departamento de Recursos Humanos de Vitória da Conquista, que por sua vez, disse que procurássemos a Secretaria Municipal de Mobilidade Urbana (Semob), o que já havíamos feito. Questionada sobre a informação de que os rodoviários são multados em 150 reais, o RH não comentou.

CARTAZ DA ATLANTICO FIXADO NOS ÔNIBUS

CARTAZ DA SEMOB (PREFEITURA)
Leia na íntegra a nota da SEMOB
Sobre o episódio envolvendo o transporte público de uma adolescente autista e de sua mãe, a Prefeitura de Vitória da Conquista, por meio da Secretaria Municipal de Mobilidade Urbana (Semob), informa que está apurando o ocorrido para adoção das medidas necessárias.
De antemão, a Prefeitura esclarece que uma portaria ou mesmo lei municipal não se sobrepõe a uma lei federal, e que a Portaria sobre a gratuidade do transporte, emitida ao Sindicato dos Rodoviários e às empresas de transporte público, trata de questões que não são amparadas por uma legislação maior, o que não se aplica aos autistas, idosos e deficientes, por exemplo, que possuem direito à gratuidade. Nesses casos, cabe aos funcionários das empresas observar e tratar as exceções conforme previstas em lei, como sempre ocorreu.
Para evitar problemas futuros, a Semob já está com a minuta de regulamentação do transporte coletivo urbano pronta, a qual permite ao autista desembarcar também pela porta da frente, e vai preparar uma cartilha de orientação e ética para cobradores, motoristas e demais envolvidos no transporte público municipal.
Além disso, a Prefeitura já solicitou às empresas prestadoras do transporte coletivo municipal que sejam oferecidos cursos de capacitação e relações humanas a cobradores e motoristas para que eles tenham conhecimento das especificidades e consigam tratá-las com o devido respeito.
Por fim, ratifica o cuidado da gestão municipal com a infância, adolescência, com os idosos, deficientes e com a população em geral, e esclarece que não há qualquer tipo de orientação para cerceamento de direitos adquiridos, como é o caso de pessoas com Transtorno do Espectro Autista.
Secom, 15 de março de 2025.
Reportagem Caique Santos